Se perguntassem no ano passado, ninguém poderia imaginar que estaríamos vivendo um 2020 tão caótico. O coronavírus se alastrou pelo planeta em menos de dois meses e tivemos que repensar nossas rotinas e atividades, colocando o modelo de vida urbana de ponta à cabeça.
É claro que existe uma relação direta entre o espalhamento do vírus e o volume e velocidade das relações que estabelecemos nas cidades. Por essa razão, o distanciamento social foi, até o momento, a principal medida para conter essa disseminação de um vírus antes desconhecido. Seria esse o fim das cidades como conhecemos?
Toda nossa concepção de urbanização vem sendo formatada pela maneira como interagimos uns com os outros, a forma que nos relacionamos no trabalho, como nos organizamos em bairros e nossos hábitos de consumo. Essa convivência foi o que fez as cidades crescerem e se desenvolverem nos últimos séculos e a pandemia mostrou como somos dependentes desse ritmo. Por mais que as coisas tenham se adaptado em muitas áreas do nosso dia a dia, a verdade é que a pandemia veio como uma ruptura na lógica urbana que conhecemos e estamos acostumados.
A solução seria, então, nos isolarmos em vilas? Ou sairmos das cidades para sítios? Me parece que não. O argumento de que o isolamento é a única forma garantida para evitar o vírus até pode nos conduzir para essas ideias de um êxodo urbano. Mas na prática, é a aglomeração em cidades que permite que tenhamos uma série de serviços e produtos essenciais ao combate à pandemia.
O fato de estarmos aglomerados em cidades permite que tenhamos milhares de interações todos os dias. Sejam elas afetivas, econômicas, criativas, de conhecimento, etc. As cidades são o ambiente para que soluções tecnológicas se desenvolvam. As comunidades potencializam as boas ideias. E, de forma mais pragmática e sob uma ótica de mercado, são as cidades que tornam a manutenção de um hospital, por exemplo, possível, tanto pela disponibilidade de equipamentos, de médicos, enfermeiros, quanto do ponto de vista da escalabilidade do negócio. E é assim para demais atividades que dependem de muita gente para se sustentarem.
Qual seria o equilíbrio, portanto? Cidades que se aglomerem o suficiente para que serviços e soluções sejam oferecidos, mas que não transformem a convivência das pessoas em uma bomba relógio de contágio? Bom, ainda não temos essa resposta ou protocolos perfeitos.
Neste momento, não se pode abrir mão de leitos hospitalares, de pesquisa de ponta ou de laboratórios. O foco deve em ser de minimizar a disseminação a partir de políticas focadas em quem mais sente os efeitos da pandemia, orientadas para achatamento da curva e também para sairmos o mais rápido possível desse contexto.
É preciso ter paciência e esperar os desdobramentos da pandemia, para fazer uma reflexão mais profunda sobre os impactos nas cidades a partir dessa crise sanitária, em vez de descartá-las por completo. E antes de determinar que as pessoas se espalhem para fora dos centros urbanos, devemos focar em elaborar protocolos de segurança para que as conexões voltem a ocorrer de maneira segura. Afinal, elas são os pilares das nossas cidades.